30 de abril de 2012

Comentário do conto "Uma Vela para Dario".

Uma vela para Dario”, de Dalton Trevisan – foi extraído do livro “Cemitério de Elefantes” (1964).

É a estória de Dario, um cidadão comum que passa mal na rua e agoniza. Vem por uma esquina e encosta-se numa parede. Alguns passantes perguntam se não está bem, mas Dario já não tem forças para responder. As pessoas que passam se acercam da cena e um senhor gordo repete que Dario caíra e deixara cair seu guarda chuva e seu cachimbo, que já não mais estão ali. Arrastam-no para um táxi, mas ninguém quer pagar a corrida. Cogita-se em chamar uma ambulância e Dario já não tem seus sapatos nem o alfinete de pérola na gravata. Dario continua à mercê daqueles que o cercam e alguém fala da farmácia, mas é no outro quarteirão e pelo seu peso, as pessoas desistem de levá-lo. É abandonado em frente a uma peixaria. Aparece mais um que se prontifica a ajudá-lo sugerindo que lhe examinem os papéis. Ele é revistado e ficam sabendo quem ele é, mas ninguém resolve nada. Chega a polícia e a cena é cercada de uma multidão de curiosos. Dario é pisoteado e o guarda não pode identificar o seu cadáver. Ainda lhe resta a aliança de ouro que Dario só conseguia tirar molhando com sabonete. Fecha-se a estória sem que a esperança de humanidade seja possível.
Claro que as pessoas se aproximam e tentam ajudá-lo, algumas levadas pela curiosidade mórbida, outras para roubar seus pertences e outras apenas porque apreciam o incidente – o autor mostra as várias tentativas que alguns fizeram de tomar alguma providência que de nada adiantaram, foram em vão, pois, na verdade, nenhum dentre os presentes chegou a assumir o problema. Houve apenas “pseudo-ajudas”, ajudas que não resolveriam o caso, ajudas paliativas, gestos infrutíferos, mínimos, quiçá para evitar eventuais culpas.
Esse é um dos contos mais famosos de Dalton Trevisan, e representa a degradação da morte em um ambiente urbano. A multidão assiste durante horas a sua agonia, movida pela curiosidade, sem um traço de piedade. É um anônimo, assim como a multidão que o cerca, sem esboçar o mínimo gesto de solidariedade, de compaixão ou respeito humano. Dario é completamente saqueado, desrespeitado e abandonado. Só o gesto do menino ameniza a miséria e a desumanidade do desfecho. “Um menino de cor e descalço vem com uma vela, que acende ao lado do cadáver” (...)
Uma vela para Dario é uma crônica que pode ser classificada como atemporal, cujo enredo imita o cotidiano, ao relatar um fato que possivelmente aconteceu e acontece nas grandes cidades brasileiras. Trevisan ilustra a sociedade atual que, na injunção de seus problemas sociais, econômicos e culturais, passa a tratar com “naturalidade” desconcertante acontecimentos que deveriam ser motivo de solidariedade por parte dos cidadãos civilizados. Ao se observar o texto, encontra-se, em cada momento da narrativa, a tônica da solidariedade. (ou da falta dela). Dario morre lentamente sem que ninguém faça nada para salvá-lo – é a realidade “nua e crua” das cidades, que vem comprovar as pseudo-ajudas dadas até então e ao se desfazer o conflito - Dario morre e fica sem os seus pertences – ratifica o sentido mais geral do texto que é a falta de solidariedade humana. Mas o autor, demonstrando que ainda acredita no próximo, insere no desfecho um personagem infantil que, numa leitura superficial, leva o leitor a pensar nas características da infância, como a inocência e a possível não contaminação de seus atos pela dureza de sentimentos demonstrada pelos outros personagens - as pessoas voltam a sua rotina, um menino de cor acende uma vela que se apaga com as primeiras gotas de chuva.


12 comentários:

Anônimo disse...

Ótima análise. Parabéns.

Anônimo disse...

Gostei da análise!

Margarita disse...

Sua análise é perfeita,e seu blog, um sonho.
Parabéns!

Margarita

Anônimo disse...

Quais os personagens principais e secundario do livro cemiterio de elefantes de Dalton Trevisan??

Mycleison Costa disse...

Muito bom, parabéns!

Unknown disse...

Ótimo comentário mais que tipo de narrador temos nesse conto!

Unknown disse...

Ótimo comentário mais que tipo de narrador temos nesse conto!

zenobia collares Moreira cunha disse...

Augusto Silva,
o narrador é omnisciente, do tipo heterodiegético, ou seja: um narrador que narra uma história da qual ele não faz parte, sendo apenas um observador dos fatos narrados. Tanto que ele narra na terceira pessoa.

Unknown disse...

Obrigado foi muito útil

Patotinha BaBy disse...

Muito profunda a analize, parabéns, muito boa a interpretação da Crônica!..

Anônimo disse...

Qual o evento central no conto

Anônimo disse...

A no ní mo